ALONSO,
Angela. Idéias em movimento – A geração
1870 na crise do Brasil – Império. São Paulo: Paz e Terra, 2002. pp. 245 -
262
O
texto a ser analisado é Teorias para Reforma, presente no livro Idéias em
Movimento – A geração 1870 na crise do Brasil - Império, da socióloga Ângela
Maria Alonso. Além dessa formação, Alonso também alcançou o doutorado pela
Universidade de São Paulo (USP), mesma instituição pela qual, atualmente, ela
ministra suas aulas. Fora do país Alonso buscou o pós-doutorado na Yale University e, também, esteve
envolvida em outras pesquisas acadêmicas.
O
capítulo sobre-citado, e pela qual está produção fica responsável em analisar,
retrata princípios intelectuais, em que alguns casos essas regras (ou
princípios) estavam inseridas em uma cientificidade própria da influencia
positivista da época. Eram intelectuais que lançavam seus olhares para as
condições do Brasil e que de certa forma estavam envolvidos em um contexto com mais
de um grupo e, portanto, mais de uma consciência a ser admitida e projetada.
Em resposta a
agenda política brasileira, o movimento intelectual da geração 1870 produziu
programas completos de reforma modernizadores, que estão tanto na conclusão de
seus livros de doutrina, como em circulares eleitorais e manifestos políticos
que lançaram em meados dos anos 1880. (p. 246)
Há
grupos tais como positivistas abolicionistas, novos liberais, federalistas
científicos, liberais republicanos em que entorno das discussões que estes se
envolviam uma que se destaca seria a passagem do Brasil que deixava de se
tornar império e dava seus primeiros passos rumo a republica. Todas as
mudanças, desencadeadas por essa ruptura de governo, passavam-se por uma
consciência de projeto, mas que não deveria sofrer com radiais mudanças. Ou seja, o contexto político envolvendo o fim
do Império junto ao surgimento do ideal republicano, o que mais tarde, tornaria
o Brasil uma republica, passa a ser estimulado não por uma apocalíptica
revolução – “Todos os grupos exorcizaram a revolução” (p.259) – nas estruturas políticas, sociais e econômicas do
país, mas pela manutenção de uma estrutura já vinda da monarquia, mas que agora
visava projetos adequados que aproximassem o Brasil da modernidade e o
capitalismo, entendido como um prolongamento gradual da Republica e federalismo
que estaria ocorrendo. Ou nas palavras de Alonso: “O liberalismo econômico reza
que o capitalismo viria a seu tempo antes, era preciso limpar o terreno para
seu desenvolvimento.” (p. 253)
No
entanto, vale ressaltar que embora alguns setores políticos estivessem
envolvidos com uma consciência e influencia externa, haveria de se pensar as
condições e especificidades que envolvia as novas transformações ocorridas no
país. Embora, pudesse supor que havia um discurso teórico diferente da prática
– ou melhor, que as “idéias estariam fora do lugar”, nota-se haver em cada
circunstancia, e no Brasil definitivamente não seria diferente, especialidades
que desencadeavam em realidades nem tanto revolucionárias.
Uma
diferença que pode ser notada é a questão do escravo nessa nova situação,
republicana. Ora, haveria grupos tais como os abolicionistas que desejavam o
fim absoluto e sem indenização da escravatura, enquanto outros, liberais
republicanos, desejavam o processo gradual do fim dos escravos. Tratavam tal questão, não como uma mudança
social ou política, mas econômica. “O
fim da escravidão era problema do tempo. Bom seria chegar a abolição sem
transtornar a propriedade agrícola, sem ofender aos direitos e interesses
envolvidos. A reforma política era independente da reforma da economia.” (p.
253)
Há
outros interesses intrínsecos ao fim da escravidão. Vontades que não era apenas
no fim do trabalho escravo, propriamente dito, mas também seria uma forma de
trazer o progresso ao Brasil, recebendo assim imigrantes europeus em troca de
escravos, provocando-se a política de branqueamento. A chegada desses novos imigrantes
seria útil para outros motivos políticos. As regiões do sudeste e sul
aumentavam sua população o que, dessa forma, “poderiam equilibrar a balança de
poder político até então pendendo para o lado nortista.” (p. 248) O projeto
proposto, visava mudar o poder do Senado para a câmara dos deputados o que,
desencadearia, em um federalismo – em que cada província, dependendo do número
de sua população, poderia emitir um maior número de políticos para
representação da região. O que pode ser analisado nessa trama de interesses
políticos é um constante setor político que, embora houvesse pensamento e
propostas mudanças na representação administrativa, ainda sim estariam
controlando o desenrolar do Brasil na republica. Esse desenrolar estava
processualmente relacionado a motivos econômicos que se exemplifica com outras
questões tal como a escravidão.
Ao
tratar do tema econômico, outra característica pensada pelos intelectuais na
época de crise Brasil Império, seria o papel mínimo do estado. Tratava-se,
portanto, de um pensamento de liberalismo econômico vindo de uma consciência e
influencia externa.
Liberais
republicanos, federalistas científicos e novos liberais gostariam de ver
ampliado o escopo da livre concorrência, da liberdade bancaria, da liberdade de
comércio e da indústria... O Estado não deveria ser um agente econômico, um
investidor. Deveria prover apenas a infra-estrutura de comunicações e
transporte (telégrafos, correio e estradas de ferro), as condições para a
expansão de uma economia capitalista. (p. 247)
Sabe-se
que, por algum período de tempo – seja no império e republica, o Brasil teve
como um dos principais produtos o café. Admitindo que o produto fosse exportado
em demasia os cafeicultores, mais tarde, junto ao estado iriam tomar medidas de
proteção a esse produto. Tais medidas se deram por meio da desvalorização
cambial o que fez o preço da moeda nacional cair em detrimento a moeda
estrangeira. Tal medida fez com que o café fosse mais comprado por estrangeiro,
pois se antes a moeda se igualava ao dinheiro estrangeiro, agora desvalorizado
o café custaria menos. Essa medida observa-se haver uma preocupação da elite em
manter sua renda pomposa como seria de seu desejo. No entanto, uma
desvalorização cambial iria prejudicar a maioria da sociedade brasileira, pois
o nosso país mais importava produtos do que exportava. Conforme a moeda
brasileira fica mais fraca em relação a estrangeira a compra de produtos
importados ficariam mais caros, mas não para os cafeicultores que iriam
compensar isso com suas vendas. No entanto, os dinheiros da compra dessas sacas
de café ficariam apenas nas mãos dos cafeicultores, trata-se, portanto, de mais
uma medida que demonstra haver uma elite interessada em se manter no lucro,
enquanto a população se via a mercê de interesse dos donos do poder.
O
que diferencia o texto de Ângela Alonso para um dos clássicos da
historiografia, que intitulou sua obra como Donos do Poder,Raymundo Faoro
estaria nos objetivos que cada um dos autores visavam compreender. Faoro com jurista que inclusive esteve como
presidente das Organizações dos Advogados do Brasil (OAB), utiliza-se de sua
linguagem e análise de juristas para compreender a situação e formação do
Brasil na republica. Enquanto que Alonso observa nesse capítulo as propostas
políticas, pouco revolucionária, que visava aos poucos construir uma nova
realidade para o Brasil. Nas palavras de Alonso, conclui-se: “O diagnóstico da
conjuntura como crise de decadência desembocou em duas conclusões: a inépcia da
elite política imperial para levar avante as reformas e a inoperância do
parlamente em processá-las” (p. 258). Diante dessas fragilidades administravas
os contestadores, visavam-se lançar a esses novos postos políticos, mas suas
posições deveriam se debruçar as “mudanças negociadas e paulatinas, sem
rupturas drásticas, sem quebra da ordem. Seus projetos têm por ponto de fuga a
transformação controlada da sociedade e do sistema político, através das
instituições e da lei.” (p. 259)
Além
disso, os projetos, desses intelectuais e contestadores, embora estivessem em
muitos sentidos questionando os saquaremas – grupo político do segundo império,
esses questionamentos se davam a partir de algumas medidas tomadas por essa
classe conservadora como: conflitos provinciais e até a Guerra do Paraguai. Mesmo,
podendo-se admitir que a passagem do Brasil império para o Brasil republica
fosse desencadeado por novos pensamentos que surgiram no contexto do império,
provocando numa possível traição contra o absolutismo – ou seja, a classe que
antes pensava uma coisa por perder o poder, passa a pensar e a questionar
outros fatores, dessa forma surgiu o partido republicano. No entanto, a ordem e
a tradição mantida pelos saquaremas durante longo tempo que estiveram no poder,
ainda continuava sendo admitida e vangloriada, pois “nisso estavam
estreitamente próximos do realismo conservador da elite imperial. O movimento
intelectual da geração 1870 não foi nem popular nem revolucionário. Foi
reformista.” (p.261) Ou seja, as novas mudanças ainda passavam pelo crivo e
pelas intenções de outras elites que em muitos aspectos se assemelhava a elite
questionada do segundo império.